Morto (mas não enterrado)
Caros amigos.
É sem pesar, e até com certo regozijo, que vos comunico estar morto. Sim, decidi que não mais vivo. Morri como forma de protesto e desabafo e agora, no post mortem, o que resta em meu coração é o alívio e a serenidade.
Confesso que a decisão foi meio precipitada, mas dela não me arrependo - nem arrepender-me-ei. A vida ia muito boa, muito bela, mas a estragavam as pessoas. As pessoas confusas, presas a conceitos que lhes fazem sofrer e lhes restringem o sadio frescor intelectual e espiritual. As pessoas que não sabem perdoar, que não têm a grandeza de agir sempre com sinceridade e que se enredam em esquemas viciosos de sofrimento causado por elas mesmas.
Morri, deliberadamente, para não mais ter de conviver com pessoas de tão torpe pensar e sentir, incrivelmente estultas e que crêem que no pequeno, no singelo, no modesto, nada de valor se encontra.
Outras, ainda, sufocam o que de mais lindo pode haver em uma vida humana - isto é, o amor - em detrimento do material. Este, mesmo feito da mais lôngeva liga é perene comparado ao verdadeiro amor, que é eterno.
Aos que desconfiam de seus irmãos sem nem os conhecê-los, condenando ao limbo o germe de uma futura amizade (ao menos para mim, as melhores amizades foram as mais improváveis) e aos que esquecem-se dos bons momentos e das mãos estendidas a eles nos momentos de necessidade também atribuo meu falecimento.
Desta forma, que festejem os que acreditam que eu lhes causava grande dano, ou que acreditavam ser eu um crápula por alguma eventual picuinha em que comigo estivessem envolvidos! De vós não levo rancor, raiva, mágoa ou qualquer sentimento.
E, meus amigos, não chorai! Não sofri, estejam certos. Melhor assim, pois os finados sempre podem aparecer aos que lhe são caros, evocando reminiscências.
Minha causa mortis foi minha vontade de viver só para os que sabem o quanto a vida é frágil.
4 Comments:
Meus parabéns pelo excelente texto, meu amigo.
Em poucas palavras você descreveu a pequenez da raça humana e, ao mesmo tempo, elogiou uma pequena parcela desta espécie por quem vale a pena viver, amar, rir, sorrir e ser, simplesmente, feliz, frugal e apaixonadamente feliz!
Abração, meu amigo
Airton
Fico feliz em saber que aprendeste a principal lição que eu, como mãe e ex mestra te ensinei:Valorizar a vida, o amor, a amizade e o ser humano maravilhoso que somos.
Não podemos amar ninguém, se não amarmos a nós mesmos...
É triste perceber que nem todas as pessoas percebem o quanto é belo viver!
Beijos com amor
mamy
Nossa muito bom, vc conseguiu fazer ate eu entender o que vc queria passar ahuahua parabens cara adorei!!!!!
Abraço ve se ecreve muito mais!!!
F3L!p@0
Moral da história: Guga vai sair do Orkut. :P
Enfim, caro gaúcho. Bem interessante a carta, usando do artifício mais “Memórias Póstumas de Brás Cubas’ (elemento impossível de não citar), você falou, e falou bonito, sobre a grande merda que vivemos hoje em sociedade. “A vida ia muito bela, mas a estragavam as pessoas.” Putaquilpariu. Resume tudo. Você é escritor desse tipo, Guga. De frases. Mas não frasista, desses que Ferreira Gullar diz escreverem orações de impacto só por pedantismo ou tentativa de deixar o texto mais “forte.”
Prefiro suas crônicas, o que não tira a genialidade do texto.
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