Dango (crônica)
Adão José Ribeiro, o Dango, dá, em pareceria com uma empresa de logística, uma série de palestras sobre trânsito, e eu tive a sorte de assistir a uma dessas palestras. Mas Dango não é legislador, não é guarda de transito, não é funcionário da EPTC nem de um centro de formação de condutores. Por sua condição especial, fica-se tentado a dizer que ele é uma vítima do trânsito.
Só que não se pode dizer isso, porque a postura de Dango é absolutamente oposta à esperada: não se ouve, na palestra dele, vontade de se postar como vítima ou como coitado; também não se ouve o menor tom autocomiseração ou mesmo de rancor.
Dango sofreu, há 12 anos, quando tinha 22 anos de idade, um acidente: pegou carona com um amigo, o carro capotou, ficou dias desacordado no hospital e, quando finalmente retomou a consciência, não podia movimentar nada abaixo do pescoço. Com o tempo e as sessões de fisioterapia, recuperou alguns movimentos limitados da mão direita, o que lhe permite movimentar a cadeira de rodas.
Seria esperado, então, que a palestra se desenvolvesse em torno de temas como violência no trânsito, relação “bebida e direção”, imprudência ao volante, tudo em um tom muito sóbrio e com ares de mau augúrio.
Muito pelo contrário. O que se vê em Dango surpreende. Ele não só tem consciência de que a revolta não mudaria a situação como também aceita as coisas com um bom humor [...]. Por exemplo, Dango relata que um dia, anos depois do acidente, policiais pararam o carro de um amigo seu, em que ele estava como carona, e pediram que ambos descessem. Adão explicou o acidente que sofrera e as consequências dele e o policial respondeu:
“Tá, então põe as duas mãos na cabeça!”
Tudo o que Dango fez foi rir e explicar de novo, e o policial retrucou:
“Tá, então fica bem paradinho aí, hein? Não te mexe!”
Dango conta que fez exatamente isso, que era a única coisa que podia fazer, e riu.
A grande lição de Adão fica sendo, então, não sobre a violência no trânsito, mas sobre a capacidade de enfrentar as situações penosas com bom humor. E, acima de tudo, sua mensagem maior é a de que a vida sempre vale a pena ser vivida.
Marcadores: Produção Textual I, UFRGS
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