O mundo em vermelho!
Última rodada da temporada de 1999. O Sport Club Internacional enfrenta o Palmeiras, no Beira-Rio, ameaçado de rebaixamento. Só a vitória salva o time porto-alegrense da segunda divisão. Há uma falta em favor dos colorados. Dunga, atualmente técnico da seleção brasileira de futebol, que geralmente fazia as cobranças de bola parada, vai para a área. A bola é alçada. Dunga cabeceia. Gol. O público no Estádio Beira-Rio irrompe em sua comemoração, "negligente, reluzente, espiralada", como diria Anaïs Nin. Tão justa, após sofrer durante boa parte do Campeonato Brasileiro com a ameaça de deixar a elite do futebol brasileiro. Já acompanhava os jogos do Inter desde algum tempo antes, mas gosto de pensar que foi a partir deste jogo que realmente me tornei um colorado.
Por isso é para mim (e para todo e qualquer colorado que sofreu com o time nos tempos ruins, incluindo aquele ano em que o único patrocínio era o de material esportivo, da Topper, e a camisa não continha nada além do brasão e do bordado da empresa de material) um júbilo inefável comemorar um título deste time. Ou, por outra, um título desta torcida, já que, segundo Nelson Rodrigues, o torcedor apaixona-se pela própria torcida, não pelo time, escudo, ou uniforme.
Quando acabou Inter 2 x 2 São Paulo, no Beira-Rio, em 16 de Agosto deste ano, eu era puro frêmito e exaltação. Acompanhei cada jogo que a TV aberta mostrou com o olhar fixo na tela. Os que ela não mostrou, acompanhei pela internet.
Com o título, foram embora jogadores considerados essenciais na vitória. Não chegou a ser um desmanche, mas perder Bolívar para o Mônaco da França, Tinga para o Borussia Dortmund da Alemanha e Jorge Wagner e Rafael Sóbis para o Bétis da Espanha certamente faz alguma diferença. Faz?
Bom, era de se acreditar que, sim, faz. Sóbis era o matador, Wagner o cobrador de faltas, Tinga o "motor" do time e Bolívar essencial na defesa. O Inter decaiu um pouco de produção no Brasileirão 2006 e não conseguiu alcançar o São Paulo, ficando com o vice-campeonato.
Os "idiotas da objetiva" previam: "Barcelona massacrará Internacional com suas estrelas"; "Inter não tem a mínima chance"; "Será chocolate espanhol"; e outras babaquices assemelhadas.
Claro, enfrentar o Barcelona dá mesmo um certo medo. Afinal, quase todo o plantel do time é de estrelas que fazem parte da seleção nacional de seus respectivos países. Mas se é para assumir uma postura derrotista, que sequer o time embarque para o confronto!
Chegou Dezembro, veio o Mundial Interclubes. Fatalmente, a final foi entre os times dos dois continentes mais fortes no futebol: Futbol Club Barcelona, campeão da Europa, e Sport Club Internacional, campeão da América.
Começa o jogo, pouco após as 8 da manhã do domingo, dia 17 de Dezembro. Um jogo, no início, surpreendentemente diferente do que se poderia esperar: Nem uma demonstração arrasadora de habilidade por parte das estrelas do time catalão nem uma pressão colorada muito efetiva. O Inter partiu ao ataque, mais que o Barça, mas sem sucesso. Ao menos o jogo transcorria sem violência.
No segundo tempo, Abel Braga, criticado pelos torcedores que crêem saber de tudo de futebol (não é e nunca foi o meu caso, sempre admiti não saber muito), substitui Fernandão, machucado, pelo ainda mais criticado Adriano "Gabiru". Mas Abel tem estrela. E Gabiru também. Aos trinta e seis do segundo tempo, ao receber passe de Iarley, marca o gol que tira gloriosamente o sorriso do rosto de Ronaldinho Gaúcho, antigo ídolo do maior rival colorado.
A partir daí, o Inter segura a bola e aguarda o som do apito. Em Yokohama, em Porto Alegre, na Austrália, em todo o mundo, urros de comemoração são desferidos como murros, violentos, impetuosos.
Hoje a delegação colorada chegou a Porto Alegre, trazendo uma bagagem mais pesada, pela taça de campeão, linda, reluzente, imponente, gloriosa. Desembarcou na base aérea de Canoas, a poucos quilômetros de onde agora estou sentado, escrevendo.
Agora a televisão mostra os carros do corpo de bombeiros conduzindo os jogadores e a comissão técnica ao templo da paixão alvi-rubra, o Beira-Rio, onde dezenas de milhares de torcedores aguardam os guardiões do brio colorado. Lá, um dos grupos que se apresentam desde aproximadamente o meio-dia recebeu uma folha de uma torcedora, que escrevera uma versão para o clássico gauchesco "Querência Amada", de Teixeirinha. Reproduzo abaixo, os trechos que consegui guardar na memória:
Deus é gaúcho/
De espora e mango/
É colorado/
Vermelho e branco/
Querência amada, meu céu de anil/
Neste Rio Grande gigante/
A estrela mais brilhante/
É aqui do Beira-Rio/
Agora, com vossa licença, vou ver a chegada deste orgulho encarnado. Presenciar a história é imperioso.
2 Comments:
Gustavo, creio que o "amor" por esse time foi transmitido á tí e teu irmão hereditariamente; lembro o quanto teu avô vibrava quando o inter jogava.
Aprendí desde cedo que "papai" é o maior.Para mim, duplamente porque teu avô também é!!!
Fico feliz em saber que somos todos "internacional" de coração!!!!
Saudações coloradas
mamy
É... Internacional jogou muito bonito. Negócio apaixonado e apaixonante do futebol, nada semelhante ao futebol comercial e publicitário de terras paulistas, fluminenses e até mesmo gaúchas.
O Inter agora virou mocinho de filme. Merecido.
A narrativa ficou foda, igualmente imbuída de paixão.
(Sifudeu, Ronaldinho.)
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