Coruja (fábula)
Havia na floresta uma coruja muito sábia, capaz de se comunicar nas línguas dos humanos e nas línguas dos animais. Pousada em um galho que balançava com a brisa da tarde, não se admirou quando viu chegar correndo um burrinho – mas ficou curiosa. Perguntou, na língua dos burrinhos:
- O que há, meu caro? Para onde vais? Do que foges?
- Do meu malvado dono – respondeu o burrinho. Ele me persegue porque fugi dele, fugi de seu temível chicote e das dores que ele me infligia.
E fugiu a trote solto para dentro da floresta.
Em seguida, veio um homem com aparência de cansaço, ofegando ruidosamente.
E a ave perguntou, em língua humana:
- O que há, meu caro? Para onde vais? A quem persegues?
- A meu burrinho fujão. Sei que fugiu porque eu o batia com o chicote, mas se ele regressasse eu não voltaria a fazê-lo.
- Veja – retrucou a coruja – eu sei falar as línguas de ambos. Posso facilitar a comunicação de vocês e convencê-lo a voltar.
Quando conseguiu reunir os dois na sua frente, a ave procedeu assim: ouvia cautelosamente um e comunicava ao outro o que fora dito. Eles foram ficando raivosos um com o outro, e a raiva fazia com que se expressassem cada vez com menos lógica, o que dava um trabalho danado à ave, que suava para conseguir comunicar tudo com rapidez e clareza.
Aconteceu, então, que já não mais se entendiam, e logicamente atribuíram a culpa à coruja. De um lado, o burrinho dizia: Você tinha um trabalho tão fácil a fazer e não o fez direito! Do outro, esbravejava o homem: fui por sua culpa que ele foi embora, você não soube persuadi-lo.
A coruja permaneceu para, com os olhos arregalados, como todas as corujas.
Moral da história: A culpa é sempre do tradutor.
Marcadores: Produção Textual I, UFRGS